Chileno descobre na região as condições ideais para a produção de espumantes de altíssima qualidade. Cave Geisse produz rótulo que virou conceito
Em atalhos por vinhedos, o quatro por quatro ameaça roçar as espaldeiras carregadas de chardonnay e pinot noir. Sobe e desce serras do terreno basáltico de origem vulcânica, repetindo o trajeto onde, há mais de 100 anos, imigrantes italianos abriram picadas nas matas nativas. Uma cachoeira se anuncia. Cai suave engrossando o curso d’água mata adentro. Dependurado sobre a queda, um deque, uma cadeira, muitas borboletas e o espumante. Você vai degustar um dos produtos Geisse no próprio terroir, vinícola onde é produzido o Cave Geisse, apontado no ano passado pela crítica internacional Jancis Robinson como o grande destaque para espumantes produzidos fora da região francesa de Champagne.
Mas essa é a história não de um italiano. É de um outro pioneiro: o chileno Mario Geisse, que chegou ao Brasil pelas mãos da Chandon nos anos 70, e hoje, numa região única no mundo para a confecção de espumantes, alcançou expertise e altíssima qualidade. Para além da espetacular bebida, busca-se também um conceito: uma produção autossustentável, em respeito à natureza e ao terroir, dirigido para a produção de uvas específicas para um solo composto por camadas de argila e rochas em decomposição, que dão a mineralidade e características especiais aos espumantes. Mais do que isso, os espumantes brasileiros de alta qualidade, com baixa adição de açúcar e produzidos pelo método tradicional em sua forma nature ou brut, tornaram-se o curinga da enogastronomia. A bebida fresca e elegante entrou de vez nos roteiros dos melhores restaurantes do país, acompanhando cardápios ecléticos, que vão de frutos do mar a carnes vermelhas com molhos leves. Como é feito o espumante pelo método tradicional (champenoise)
1) A uva é colhida e levada para a câmara fria, evitando perda aromática e a pré-fermentação; 2) Da câmara fria, a uva vai para a mesa de seleção; 3) Após a prensagem automatizada, o suco (mosto) é enviado aos tonéis de aço, em dutos específicos para cada tipo de uva. Neles, é elaborado a partir do mosto o vinho-base, que ainda sofrerá a segunda fermentação nas garrafas; 4) Engarrafamento; 5) Fermentação na garrafa a temperaturas controladas entre 12 e 13 graus nas caves de fermentação. Durante esse processo, que leva entre quatro e seis meses, as garrafas são deitadas na horizontal. As leveduras vão se alimentar do açúcar e transformá-lo em álcool, liberando gás carbônico, o que dá origem à perlage do espumante. Isso vai se dar de forma lenta e homogênea; 6) Após a fermentação, as leveduras morrem e entram em processo de autólise, liberando proteínas, sais minerais, matéria nitrogenada, aminoácidos, o que levará a toda sofisticação e complexidade do espumante. As garrafas ficam em repouso por período que pode se estender de meses a anos, dependendo da vinícola e da sofisticação do produto; 7) Remuage em pupitre ou giropalete é o processo de limpeza do líquido nas garrafas, que são giradas em geral durante 20 dias. Quando girada, a garrafa vai sendo progressivamente inclinada até a posição vertical, de modo a empurrar as leveduras para o bico. No opérculo (tampa de plástico), fica sedimentada toda a levedura morta; 8) No processo de dégorgement, o bico das garrafas é congelado, formando um tampão de gelo que aprisiona as leveduras. Quando a garrafa é aberta esse tampão é expulso pela pressão do gás carbônico; 9) É colocada a rolha e a gaiola da garrafa.
Entenda a produção de espumantes no Brasil
» A qualidade da uva é o grande diferencial no processo vitivinícola. Certas localidades da Serra Gaúcha, particularmente no município de Pinto Bandeira, reúnem condições únicas no mundo para a produção de uvas para espumantes: microclima favorável, a região alta, com boa exposição solar e o solo de basalto fragmentado pelo tempo, possibilitando boa drenagem. Em decorrência dessas condições, as uvas alcançam o amadurecimento completo da casca, semente e polpa, com excelente acidez e baixo teor de açúcar, o que é essencial para o espumante de alta qualidade.
Principais características do espumante brasileiro
» O champanhe e o espumante brasileiro apresentam estilos diferentes. Os espumantes de vinícolas altamente especializadas produzidos no Sul do Brasil pelo método tradicional (champenoise) com as uvas chardonnay e pinot noir se rivalizam em qualidade com o francês. A bebida produzida no Brasil é mais fresca, equilibrada em acidez e em estrutura, com níveis de açúcar mais baixos, o que a torna muito mais fácil de beber e de harmonizar
com qualquer prato do que o champanhe francês.
Fonte: Estado de Minas